O ano de 2023 pode ser um tempo de viragem na política e na governação da saúde em Portugal ou mais um ano perdido, com agravamento da desagregação do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
1. Todos têm um papel a desempenhar
O SNS necessita de mais capital humano, tecnológico e financeiro. Mas não basta acrescentar, é também necessário transformar — uma nova centralidade para as pessoas, a melhor integração de cuidados, gerir a informação e o conhecimento num contexto de inteligência distribuída e colaborativa, um plano de investimento plurianual no SNS, uma estratégia de cooperação transparente com os sectores privado e social, um novo modelo de governação e governança.
Há já duas décadas, um trabalho sobre as expectativas dos europeus em relação aos seus serviços de saúde, “The European Patient of the Future” (2003), concluía: “(...) receiam que falte aos seus governantes a cultura, a imaginação e a vontade necessárias para canalizar para soluções de interesse comum o enorme potencial de inteligência, conhecimento e inovação disponível na sociedade atual.” Há, no entanto, uma pequena grande limitação na formulação desta conclusão. Esta radica no foco exclusivo nos governantes e no esquecimento do papel essencial dos governados. Estes não podem simplesmente esperar para ver. Todos têm um papel a desempenhar.
Numa altura em que o SNS, como instituição, ganha um novo estatuto de autonomia e uma direção-executiva, há fortes expectativas e potencialidades para mudanças significativas. É necessário convocar o conjunto da sociedade para compreender, participar, contribuir e apoiar esse processo de mudança.
2. Os “estados gerais”
Há dez anos constituiu-se em Portugal a Fundação para a Saúde — SNS, como organização de caráter cívico, independente de qualquer poder político ou económico, tendo precisamente como missão salvaguardar e promover o SNS. No decurso de 2022 a Fundação elaborou e publicou dez teses para a transformação do SNS.
É chegado o momento de contribuir para mobilizar a sociedade portuguesa para as mudanças necessárias, convocando os “estados gerais” para a transformação do SNS através de um conjunto de sessões de trabalho, a iniciar já no próximo mês de fevereiro, no Porto, e percorrendo de seguida várias cidades do país.
As sessões dos “estados gerais” são desenhadas para incluir uma primeira parte em que se debate o processo de mudança em si — como pode ser pensado e como, possivelmente, se desenrolará — e uma segunda parte para identificar e discutir exemplos concretos de transformações desejáveis ou em curso na região onde as sessões têm lugar. Tanto o primeiro como o segundo destes “tempos” incluem uma forte componente participativa nos debates propostos.
3. Percorrer o país real
Os “estados gerais” propõem-se percorrer o país real. Estão já previstas e em fase de planeamento, no primeiro semestre de 2023, sessões dos “estados gerais” nas cidades do Porto, Évora, Coimbra e Setúbal. A localização das sessões está em grande parte relacionada com a disponibilidade de uma “comissão organizadora local” para trabalhar com a “comissão coordenadora nacional” para levar àquela cidade e região os “estados gerais — transformar o SNS”.
As informações proporcionadas e os temas debatidos nas sessões dos “estados gerais” serão divulgados pelas edições online da newsletter “Notícias dos Estados Gerais”.
Não podemos ficar à espera que alguém faça por nós o que esteja ao nosso alcance fazer.
Professor catedrático jubilado da ENSP