Na sequência da primeira conferência dos Estados Gerais - Transformar o SNS, a Fundação para a Saúde - FSNS e o Jornal de Notícias irão publicar algumas das comunicações em versão de artigo.

Estados Gerais da Saúde
A gestão da mudança e as pessoas – afinal, sem elas nada muda
Serão abordados os mecanismos mais habituais de resistência à mudança, tanto a nível individual como institucional, bem como estratégias para as combater. Um exemplo incontornável é a cada vez maior importância da tecnologia, não apenas em áreas como o diagnóstico e o tratamento, mas também na valorização da relação médico-doente, presencial e à distância. Valorização essa pressupondo condições de trabalho dignas, que evitem o "divórcio" entre médico e doente provocado pela omnipresença de um ecrã
A mesma tecnologia contribuirá para maior autonomia do doente no controlo do seu estado e das variáveis a privilegiar, assim libertando os profissionais de saúde para outras tarefas, pela comunicação atempada de resultados que não dispensam avaliações subjectivas e muito menos a consulta regular, que permanecerá o núcleo nobre de todo o processo terapêutico.
Se neste tipo de relação o nível de literacia do doente deverá, obrigatoriamente, ser melhorado, por maioria de razão ele se torna fulcral quando perseguimos o objectivo de tornar os cidadãos agentes produtores de Saúde e estilos de vida saudáveis, como preconiza a OMS. Serão abordados exemplos de vias conducentes ao empoderamento das pessoas em geral e dos doentes em particular, que permitem a sua colaboração com os profissionais de saúde em áreas tão diversas como a investigação, a clínica e a recuperação.
Merecerá um sublinhado a especificidade dos tempos que vivemos: ultrapassado que parecia ter sido o paradigma das doenças infecciosas agudas, substituído pelo da predominância de doenças crónicas não transmissíveis, potenciadas pelo cada vez maior envelhecimento das populações ocidentais e exigindo um acento tónico na arte de Cuidar, classicamente reservada a outras profissões, deparámo-nos com uma pandemia que se encarregou de nos alertar para o difícil equilíbrio entre a resposta rápida a uma ameaça a curto prazo - se exceptuarmos as consequências psicológicas - e a manutenção do acompanhamento devido a outras patologias, tanto ao nível de diagnóstico como de tratamento. O esforço pedido aos profissionais de saúde e à população geral, sobretudo a mais desfavorecida, tem sido enorme, com consequências graves que puseram a nu fragilidades antigas e já diagnosticadas do SNS.
Por último, será salientado que as mudanças indispensáveis à melhoria da Saúde Pública em geral e do bem-estar físico e psicológico dos profissionais e dos cidadãos por eles cuidados implicam uma acção concertada de diversos tentáculos do Poder - lembremos problemáticas como a habitação, a poluição e as áreas verdes -, apoiada no conhecimento real da situação no terreno, que não se compadece com receitas generalistas desenhadas em torres de marfim.
A mudança verdadeira, a que melhora a vivência das pessoas - incluindo a dos profissionais de saúde! -, só é possível depois de escutar atentamente as suas vozes e as tornar o condimento que transforma a receita cega numa estratégia eficaz para todos os paladares.
*Médico Psiquiatra